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Sankofa, o Envelhecimento Negro e a Cor da Longevidade: Resgatar para Avançar!

O símbolo africano ganês Sankofa, representado por um pássaro que voa para frente com a cabeça voltada para trás, carregando um ovo — símbolo do futuro — nos convida a olhar para o passado, resgatar o que foi esquecido ou negado, e seguir em frente com sabedoria.

Envelhecer, para a população negra, não é apenas atravessar o tempo — é resistir a múltiplas formas de exclusão. Um corpo negro que envelhece carrega nas rugas o enfrentamento por respeito, dignidade e justiça.


A promoção e proteção dos direitos humanos para a população afrodescendente tem sido uma prioridade para a Organização das Nações Unidas (ONU). Como ação, a Assembleia Geral da ONU proclamou em 2015, a década dos afrodescendentes para ser observada até 2024. O tema foi "Reconhecimento, Justiça e Desenvolvimento", a década foi renovada para a Segunda Década Internacional de Afrodescendentes, com o mesmo tema, no período de 2025 a 2034.


A proclamação da Segunda Década representa nova oportunidade para que pessoas afrodescendentes possam usufruir plena e efetivamente dos benefícios do desenvolvimento sustentável e de todos os seus direitos humanos.

O objetivo da Década dos Afrodescendentes é aumentar a conscientização das sociedades no mundo quanto ao combate do preconceito, da intolerância, da xenofobia e do racismo. O documento que cria a Década destaca que apesar de muitos esforços pelo mundo, “milhões de seres humanos continuam a ser vítimas do racismo, da discriminação racial, da xenofobia e da intolerância relacionada, inclusive suas manifestações contemporâneas, algumas das quais tomam formas violentas”.


A discriminação e o preconceito racial afetam pessoas negras nas diversas fases da vida, desde a primeira infância à velhice , geram um impacto negativo e acumulam desvantagens de ordem física, psicológica, social, material entre outras.

O envelhecimento populacional já é um fenômeno presente no Brasil, a queda da fecundidade e a diminuição da natalidade estreitou a base da pirâmide social. O censo de 2022 revelou que o total de pessoas com mais de 65 anos teve uma alta de 57,4% frente a 2010. De acordo com o IBGE (2022), o número de pessoas idosas cresceu 57,4% em 12 anos, corresponde a 15,8% da população total do país. Desta parcela, 47,7% da população idosa é negra. Em termos de longevidade média e qualidade de vida, pessoas brancas tendem a envelhecer mais e melhor do que pessoas negras. E entre pessoas negras são os homens os que menos atingem a idade dos 60 anos.


A letalidade precoce dos homens negros, a velhice em situação vulnerável das mulheres negras são alguns pontos que precisam ser analisados na perspectiva do envelhecimento como um direito humano e com dignidade.

De acordo com pesquisa realizada pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) e o Itaú Viver Mais (2021), em São Paulo e Salvador os indicadores de exposição à violência têm pior desempenho, de modo geral. Do ponto de vista das desigualdades raciais e de gênero, na capital paulista homens negros estão mais expostos à violência que homens brancos. Em São Paulo, a exposição à violência dos homens negros é pior que a dos homens brancos em todas as faixas etárias, chegando a uma diferença de 25,0 pontos entre aqueles com 80 anos ou mais. Na capital baiana, são as mulheres negras as mais expostas à violência.


Pesquisas mostram a diferença salarial entre homens brancos e mulheres negras, diferença que acompanha esses grupos sociais na velhice. Em pesquisa realizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), em valores, o salário médio das mulheres negras é de R$ 3.040,89, enquanto o de homens brancos é de R$ 5.718,40, uma disparidade de 53,17%. (MPT,2024).

As mulheres negras envelhecem sem aposentadoria digna, sem segurança financeira e, muitas vezes, sem acesso a saúde adequada. São as maiores dependentes do BPC – Benefício de Prestação. Muitas continuam trabalhando até idades avançadas, sem qualquer rede de apoio e sendo responsável, em muitos casos, pelas diversas formas de cuidado, com a ausência de reconhecimento e valorização. O ciclo da pobreza perpetua quando suas filhas e netas enfrentam os mesmos obstáculos, com pequenas variações.

Lélia Gonzalez - intelectual negra, ativista , filósofa e antropóloga, falecida em 1994 – desde a década de 1970 , muito refletiu, falou e escreveu sobre a tripla opressão (gênero, raça e classe) que atravessa os corpos das mulheres negras. Infelizmente, os dados demonstram que essa realidade se mantêm entre a maioria de nós, mulheres negras.


A pesquisa revela ainda que, em relação a diferença salarial entre mulheres brancas e homens negros, “ mulheres brancas também recebem mais que os homens negros,om uma diferença de aproximadamente 26%. Este é o único recorte no qual a remuneração masculina é menor do que a feminina”. (MPT,2024)

É de fundamental importância apresentar dados, refletir sobre os impactos das diferenças ao longo da vida e os impactos na velhice negra, bem como encontrar rotas para acertar o caminho durante as fases da vida para que pessoas negras consigam atingir os 60 anos e viver a velhice com mais qualidade de vida, felicidade, com segurança e em condições ambientais e materiais em que consigam usufruir dos bens materiais socialmente produzidos ao longo da vida.


Por fim, a importância da observância e respeito às legislações que garantem direitos a população negra a exemplo do Estatuto da Igualdade Racial, a Política Nacional Integral de Saúde da População Negra, as ações afirmativas , em especial as cotas raciais no serviço público e nas universidade, a Lei 10.639 e 11.645, entre outras, são instrumentos jurídicos que refletem a possibilidade de atingir a equidade e justiça racial para a geração de futuras pessoas idosas negras.


O envelhecimento negro desafia o tempo e o sistema, é o movimento de sobreviver onde dizem que não há sobrevivência, dar visibilidade onde tentam nos tornar invisíveis. “É também garantir que as próximas gerações tenham um lugar à sombra das árvores que plantamos enquanto estávamos aqui”. Raymond Jetson,2025.


Viva Zumbi!


Autora: Suelma Inês Alves de Deus, ativista na Soweto Organização Negra-CONEN-SP, no Grupo de Estudo das Relações Raciais no Serviço Social – GERESS e membro do Instituto GERA.

 
 
 

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por Alinne Motta

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